“É um contrassenso deixar de aplicar o previsto na Lei por conta da elevada demanda de processos”, diz advogada sobre nota da CNJ
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, na quarta-feira (15), nota técnica na qual se manifesta contra o Projeto de Lei 3.244/2020, que prevê a ampliação das competências das varas de violência de doméstica. De acordo com o documento, além de processar casos envolvendo agressões contra mulheres, os juizados passariam a analisar questões sobre partilha de bens e divórcios.
A nota sustenta que, em caso de aprovação da matéria pelo Congresso, a medida aumentará o volume de processos nessas varas e prejudicará a análise célere de medidas protetivas solicitadas contra os agressores.
De acordo com advogada e conselheira diretora da Themis Luana Pereira da Costa, a competência híbrida, cível e criminal das varas especializadas de violência doméstica já é uma previsão da Lei Maria da Penha.
“Os juizados especializados não foram pensados para serem um balcão de concessão de medidas protetivas, as quais são somente um dos instrumentos de proteção previstos na LMP. É importante que se considere que as situações de violência de gênero, raça e classe a que mulheres são submetidas nas suas relações de intimidade não se resumem à atuação jurídica penal. Mulheres são revitimizadas em processos de família, por exemplo, relatando, muitas vezes, a continuidade das violências psicológica e moral através dos processos judiciais. A Lei prevê uma atuação integral, ancorada pelos eixos de proteção, prevenção e repressão e não somente este último. É um contrassenso deixar de aplicar o previsto na Lei por conta da elevada demanda de processos envolvendo o tema. Ao contrário, se a demanda é alta, o que deve se observar é que mais recursos financeiros e humanos devem ser direcionados para acolher e oferecer uma resposta jurídica eficaz e integral a mulheres em situação de violência”, avalia Luana.
No Brasil, segundo o CNJ, há 139 varas exclusivas para julgamento de processos envolvendo a Lei Maria da Penha. Cerca de 1 milhão de processos tramitam nesses juízos.
A Lei Maria da Penha, sancionada em 7 de agosto de 2006, prevê diferentes formas de violência contra as mulheres, dando visibilidade ao tema, além de estabelecer uma atenção integral às mulheres em situação de violência ao definir um conjunto de ações de prevenção, proteção e responsabilização dos agressores. Definiu, ainda, como medida de ampliação do acesso à justiça às mulheres e devida diligência, a criação dos Juizados Especializados de Violência Doméstica e Familiar para julgamento e execução de causas cíveis e criminais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.
A importância de sua implementação foi objeto de Nota Técnica, elaborada em outubro de 2020 pelo Consórcio Lei Maria da Penha, quando da tramitação de outro PL. A nota traz uma série de recomendações ao CNJ, dentre elas a implementação da Política Judiciária adotada pelo órgão que prevê o fomento da criação e estruturação de Juizados Especializados de Violência Doméstica e Familiar com competência híbrida.