Entrevista: juíza Karen Luise Vilanova Batista de Souza
Aprovada para integrar o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), a juíza Karen Luise Vilanova Batista de Souza construiu sua trajetória unindo o trabalho no Judiciário à promoção dos direitos humanos, da equidade racial e da participação das mulheres nos espaços de decisão. Sócia da Themis – Gênero, Justiça e Direitos Humanos, Karen tem longa história de colaboração com a organização, especialmente em iniciativas como a formação das Promotoras Legais Populares (PLPs) e projetos voltados ao enfrentamento da violência doméstica. Nesta entrevista, ela fala sobre os desafios e as prioridades no CNMP, o significado de sua nomeação e a importância de parcerias para transformar realidades. A posse da juíza no CNMP deve ocorrer nas próximas semanas. Confira:
Como a senhora recebeu a aprovação unânime de seu nome para o CNMP pelo Senado? O que essa nomeação representa para sua trajetória e para as causas que marcam sua atuação no Judiciário?
Acredito que essa aprovação é um reconhecimento coletivo do trabalho que venho desenvolvendo e representa a consolidação da minha trajetória como magistrada, sempre pautada pela promoção dos direitos humanos e pela valorização da questão racial dentro das instituições. Também sinaliza o que a sociedade espera de um Conselho Nacional do Ministério Público: compromisso com a democracia, com os direitos fundamentais e com a proteção das pessoas mais vulneráveis. Trajetórias como a minha são construídas a muitas mãos. Nenhum reconhecimento é solitário. Ao longo do caminho, encontrei pessoas e organizações, como a Themis, que se somaram ao meu trabalho, ofereceram apoio e inspiração. Quero continuar contando com essas parcerias, porque é por meio delas que conseguimos traduzir as demandas sociais e abrir caminhos para que as vozes da sociedade sejam ouvidas e respeitadas.
Na sabatina, a senhora afirmou que a Constituição é sua “bússola”. Como esse compromisso se traduz no trabalho que pretende desempenhar no CNMP?
A Constituição de 1988 é nosso pacto democrático. Para mim, ela orienta cada decisão, porque garante direitos fundamentais e estabelece princípios como moralidade, impessoalidade, eficiência e transparência no serviço público. No CNMP, quero trabalhar para que o Ministério Público atue alinhado a esses valores, assim como tenho feito no Judiciário, com projetos ligados a direitos humanos, paridade de gênero, equidade racial e proteção de populações vulneráveis.
A presença de mulheres nos espaços de decisão no sistema de Justiça ainda é um desafio. Que significado tem sua aprovação para essa agenda?
O Judiciário e o Ministério Público continuam sendo majoritariamente masculinos, apesar do aumento de mulheres que ingressam nessas carreiras. O simbolismo da minha nomeação está em mostrar que é possível ocupar esses espaços, mas o desafio vai além de chegar: é criar condições para que outras mulheres também cheguem e exerçam suas funções de forma transformadora. Precisamos olhar para as diversas realidades femininas, como as mulheres negras, indígenas, em situação de violência, e construir políticas que atendam a todas.
Sua trajetória tem diálogo intenso com o movimento de mulheres, inclusive com a Themis. Pode contar um pouco dessa experiência?
Minha aproximação com a Themis começou em Porto Alegre, quando trabalhamos questões ligadas à participação feminina. Colaborei com os cursos de Promotoras Legais Populares, dando aulas sobre violência doméstica, Tribunal do Júri e feminicídio. Sempre busquei levar a experiência do Judiciário para fortalecer o trabalho dessas mulheres.
Entre as atribuições do CNMP estão a defesa dos vulneráveis e o acompanhamento do impacto das decisões na vida das pessoas. Quais serão suas prioridades?
Ainda é cedo para definir em quais comissões atuarei, mas, onde quer que eu esteja, quero priorizar mulheres, crianças, população negra, povos indígenas e comunidades tradicionais. Também considero essencial acompanhar o cumprimento das decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e incentivar a nacionalização de boas práticas já desenvolvidas por promotoras e promotores no país. Meu compromisso, que vem desde que vesti a toga, há 26 anos, é fazer cumprir a Constituição.