28 de Setembro: 28 razões para legalizar o aborto no Brasil
Neste 28 de Setembro, celebra-se o Dia Latino-americano e Caribenho pela Legalização do Aborto. No Brasil, em especial, estamos enfrentando um momento de retrocessos e ataques constantes aos nossos direitos reprodutivos.
Dados de 2020 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram que 181 estupros são registrados por dia no país – e 57,9% das vítimas têm até 13 anos. A gravidez que decorre por abuso sexual é um dos casos nos quais o aborto é permitido por lei, mas a pandemia de coronavírus aumentou ainda mais os obstáculos para o acesso aos serviços de saúde, especialmente para as mulheres e meninas mais pobres. Por isso, é importante colocar em pauta essa importante discussão e nos aliar a grupos e entidades que discutam o aborto na nossa sociedade.
A Frente pela Legalização do Aborto do Rio Grande do Sul – FrePLA RS é uma delas. A organização está com uma série de ações previstas nesta terça-feira e seguirá até outubro ou meados de novembro. Além disso, a Frente organizou um documento no qual lista 28 razões para legalizar o aborto no Brasil.
São elas:
- Nenhuma mulher deve ser presa, punida, maltratada ou humilhada por ter feito um aborto.
- A maternidade não é um destino nem pode ser imposta como uma obrigação.
- A gravidez é uma experiência da vida das mulheres, interromper a gestação também!
- Os métodos contraceptivos podem falhar e provocar efeitos colaterais.
- Manter ou interromper uma gravidez é uma decisão que só cabe à quem gesta!
- Direitos reprodutivos devem ser direitos fundamentais para todas as mulheres e pessoas com útero.
- Pelo direito de escolher ter filhos/as e viver a maternidade livre de violências.
- Pelo direito ao aborto sem risco de morte ou adoecimento.
- A criminalização do aborto não reduz sua ocorrência, mas traz sofrimento e risco de morte para as mulheres.
- A clandestinidade do aborto impede às mulheres o acesso ao atendimento integral e humanizado de saúde.
- A criminalização do aborto mantém as mulheres sem informações sobre seus direitos sexuais e reprodutivos.
- A gravidez indesejada não ocorre apenas do sexo forçado ou “irresponsável”.
- A ilegalidade do aborto viola os direitos humanos, bloqueia o exercício de sua liberdade, autonomia e autodeterminação.
- Coibir a violência institucional nos serviços de saúde e planejamento reprodutivo.
- Abortos inseguros podem causar sequelas permanentes, que impedirão vivenciar uma futura gestação planejada e esperada.
- Garantir a educação sexual e reprodutiva não sexista, antirracista e sem discriminação a população LBTQIA+ na formação dos servidores públicos.
- Combater o machismo, o racismo, a heteronormatividade e a cultura patriarcal.
- Acabar com a tutela religiosa sobre a moral coletiva, concretizar a laicidade constitucionalmente instituída, efetivando com base nos direitos humanos.
- Coibir a prática de perseguição e criminalização de defensoras/es dos direitos sexuais, reprodutivos das mulheres.
- Objeção de consciência não pode impor violação de direitos.
- A criminalização traz custos ao SUS.
- Gestação de menores de 14 anos é estupro presumido, a criminalização do aborto impõe barreira no acesso a informação.
- O aborto inseguro é a quarta causa de morte materna no Brasil, em alguns estados a primeira.
- A desqualificação religiosa, moral e a ilegalidade não impede a realização do aborto, mas provoca medo e causa mortes.
- A escolha por uma gravidez deve ser de ambos os parceiros, mas a responsabilização de uma gravidez indesejada recai sobre quem gesta.
- A criminalização e ilegalidade naturalizam a violência contra meninas e mulheres.
- Forçar uma gravidez não-intencional é violar os direitos humanos.
- Implantar e fortalecer serviços de aborto legal no SUS é garantir acesso das mulheres aos seus direitos.
Vale rever
No ano passado, a Themis e o Fórum Aborto Legal RS publicam o Guia do Aborto Legal e de Cuidado à Pessoa em Situação de Violência Sexual e um vídeo explicativo sobre o tema.
Dia de luta
Entenda, a seguir, como surgiu este dia de luta e como esta história foi construída, com resistência e persistência. Quem relata são integrantes da Frente pela Legalização do Aborto do Rio Grande do Sul – FrePLA RS.
“A década de 1990 foi marcada pela retomada e a internacionalização das pautas feministas com relação à saúde das mulheres. É nesse contexto que temas como aborto e sexualidade tornam-se pautas políticas do Movimento Feminista no Brasil em busca de um novo modelo de assistência à saúde da mulher.
Foi durante o V Encontro Feminista da América Latina e Caribe, em 1990 na Argentina, que foi criada a “Campanha 28 de Setembro – Dia da Descriminalização do Aborto na América Latina e Caribe”, quando se torna data fundamental de lutas pela descriminalização das mulheres e, também, legalização do aborto.
Em 1993, no Uruguai, o tema central da Campanha foi a Maternidade Voluntária e foi coordenada pelo grupo Católicas pelo Direito de Decidir. O Uruguai legalizou o aborto em 2012, sendo o segundo país da América Latina a fazê-lo (o primeiro foi Cuba, em 1965). Recentemente, no final de 2020, tivemos a legalização na Argentina e em 2021, no México, o aborto foi descriminalizado por unanimidade dos ministros da Suprema corte, garantindo que as mulheres mexicanas não mais sofrerão penalidades criminais por decidirem sobre seus corpos.
Em todos esses anos, nós feministas brasileiras estivemos presentes na luta. Há exatos vinte anos, foi elaborada a Carta de Guanabara, durante a reunião “Aborto na América Latina e no Caribe – direitos das mulheres frente à conjuntura mundial”, promovida pela Campanha 28 de Setembro, no Rio de Janeiro, com a participação de feministas de 27 países. Nos anos posteriores, seguiram-se atos em todos os estados brasileiros, sob o slogan: “nenhuma mulher deve ser presa, ficar doente ou morrer por abortar”.
Em 2008, surge a Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto no Brasil com o objetivo de sensibilizar a sociedade para o tema, após episódio de criminalização de mulheres, ocorrido no estado de Mato Grosso do Sul, com participação da mídia e condenação de profissionais de saúde à pena de prisão e de mulheres à pena alternativa de trabalho comunitário. Todas nós conhecemos uma mulher que já fez aborto. Nenhuma de nós gostaria de ver essa mulher morta ou presa pela criminalização.
A Frente Nacional é composta por organizações nacionais, coletivos locais, frentes estaduais e movimentos sociais com o objetivo de chamar atenção para a garantia de proteção dos direitos à saúde sexual e reprodutiva das mulheres e das pessoas que engravidam, atuando pelos direitos reprodutivos e na defesa da autonomia das mulheres. A primavera feminista, em 2015, barrou o Projeto de Lei que dificultaria o Aborto Legal.
O que vemos nestas três décadas de lutas por justiça reprodutiva é que pouco conseguimos avançar. Estamos em 2021 e ainda precisamos falar sobre aborto. Desmistificar velhas crenças morais. Falar sobre a situação de saúde, violência e vulnerabilidade das mulheres e pessoas que podem abortar e que precisam ter acesso a este direito, e que mesmo nas situações previstas em lei, comumente enfrentam barreiras.
O resgate da história mostra que apesar de todas as dificuldades, a verdade é que nunca nos pararam ou calaram! Seguimos lutando pela legalização do aborto.
A descriminalização e a legalização do aborto são medidas necessárias para impedir o encarceramento e/ou a morte decorrente de procedimentos clandestinos e para garantir que todas as pessoas que engravidam tenham pleno acesso aos serviços de saúde sexual e reprodutiva através do SUS: educação sexual para decidir, contraceptivos para não abortar e aborto legal, seguro e gratuito para não morrer.