Há 25 anos na defesa e promoção dos direitos das mulheres

Themis entrevista: Karin Vervuurt, diretora-presidente da ONG Elas no Poder e coordenadora de conteúdo da Im.pulsa

Neste período eleitoral, a Themis publica uma série de entrevistas com representantes de projetos e movimentos que estimulam a participação das mulheres na política. Uma destas iniciativas é a Im.pulsa, que apoia mulheres a se sentirem mais confiantes para movimentar a política latino-americana com diversidade e representatividade. Aberta e gratuita, a plataforma oferece formação política por meio de produtos práticos com linguagem acessível e afetiva. Confira a entrevista sobre participação das mulheres na política com Karin Vervuurt, diretora presidente da Elas no Poder e coordenadora de conteúdos da Im.pulsa. 

Por meio da atuação na ONG Elas no Poder e na Im.pulsa, como você observa a participação das mulheres na política no Brasil?

As mulheres têm despertado mais politicamente, elas querem saber mais, ocupar mais espaços e entender a política para participar dela. Elas também têm mudado muito a mentalidade para “eu preciso votar em uma mulher porque só uma mulher sabe o que uma mulher precisa”. Também percebemos que estão surgindo cada vez mais movimentos e organizações parecidos conosco, com o objetivo proteger as mulheres de violência política ou ajudá-las a chegar lá. Isso é muito legal porque mostra que estamos conseguindo avançar nesta discussão. Ainda falta um longo caminho, mas estamos evoluindo. Infelizmente, o aumento nas candidaturas de mulheres ainda não se reflete no aumento das eleições de mulheres. O desafio é conseguir eleger mais mulheres e mantê-las seguras na política. A violência política de gênero aumentou consideravelmente no último mandato presidencial, esses espaços estão cada vez mais hostis às mulheres.

As ONGs Elas no Poder e A Im.pulsa têm realizado, nos últimos anos, um intenso monitoramento da atuação das candidatas mulheres no Brasil e na América Latina. Qual a expectativa para as eleições de outubro?

Karin Vervuurt – É difícil saber se elegeremos mais mulheres porque há muitas variáveis. A variável do conhecimento e do treinamento, onde atuamos mais, é importante mas não é suficiente. Fazer campanha eleitoral no Brasil é muito caro, e construir uma campanha sem dinheiro limita significativamente as possibilidades competitivas. E hoje, as mulheres não têm acesso ao recurso que elas precisam para serem candidatas competitivas. Em geral, as pessoas que doam para as campanhas no Brasil são homens, são executivos, brancos… Eles doam para candidatos que estejam relacionados às pautas deles, então as mulheres não são beneficiadas por estes recursos. Os partidos também têm seus beneficiários, que em geral são homens bem articulados dentro da sigla. E as pessoas físicas, no geral, doam pouco ainda para candidaturas de mulheres. A barreira financeira é muito forte. Ainda que exista uma cota para o financiamento de campanhas femininas. Eleger mulheres tem sido muito difícil devido a barreira financeira, principalmente. Tem um projeto muito legal chamado 72 horas, que monitora os repasses dos partidos. Em 2020, foi detectado que o dinheiro para as candidaturas sai primeiro para os homens, em grande escala. Os recursos para as mulheres são poucos e liberados mais nas últimas semanas da campanha. Tudo indica que esse ano será a mesma lógica. Precisamos fazer muita pressão para que essa lógica mude. Se houver um aumento das mulheres na política, ainda será muito pequeno, aquele passo de formiguinha.

Como podemos aumentar a representatividade feminina no Congresso  e como isso impacta a vida das mulheres?

Há pesquisas no mundo todo apontando que, quando as mulheres entram na política, mudam as prioridades das políticas públicas. Elas priorizam saúde, educação e renda básica e assistências para pessoas que estão em necessidades.  O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) sobe e a desigualdade diminui. Quando pensamos em uma sociedade pós-Covid, essas são áreas extremamente necessárias. Além disso, as pesquisas também mostram que quando há mais mulheres na política, conseguimos diminuir a taxa de corrupção dos governos e há mais facilidade de entendimento e articulação com outros mandatários, mesmo que sejam de partidos  ou ideologias diferentes. Os mandatos de mulheres também são mais participativos, com diálogo aberto com as pessoas e a sociedade civil organizada. Uma pesquisa realizada no Brasil e divulgada durante a pandemia mostrou que nas prefeituras onde há mulheres a taxa de mortalidade infantil diminuiu. Essas são algumas das coisas, mas há muitas pesquisas mostrando por que é importante mais mulheres ocuparem a política e os espaços de poder para construir políticas públicas que reflitam as necessidades da sociedade.

O tema da representatividade das mulheres na política vem sendo apropriado por candidatas que não representam o campo democrático que historicamente promove e defende os direitos das mulheres. Como ficar atentas a esta questão?
Essa é uma questão mais complexa. Acho que não é toda mulher que vai defender as pautas que precisamos que sejam defendidas, então é possível elas fazerem uso da narrativa de “mais mulheres na política”, chegarem lá e fazerem o oposto do que consideramos que seria o ideal. Ao mesmo tempo, uma coisa que costumamos falar muito é: entre uma mulher conservadora e um homem conservador no Congresso, eu mil vezes prefiro uma mulher. Sabemos que em pautas básicas, iremos concordar. Garanto que uma política de direita vai concordar que a violência contra as mulheres é um problema, e é uma questao que até hoje nao conseguimos resolver no Brasil.  Mesmo com outra mentalidade, uma mulher conservadora pode ser uma aliada em algumas pautas. De certa forma, nas lutas que precisamos ter, uma mulher de direita será mais aliada que um homem de direita. Precisamos abrir certas concessões, e conversar com essas mulheres é uma delas. Precisamos trazê-las para perto. Em várias outras pautas importantes, não conseguiremos avançar porque elas não estão ao nosso lado. Mas discordar também faz parte da política e temos de aceitar que elas também representam parte da população. Elas representam mulheres que não concordam com o que pensamos. Por mais que discordemos, eu gostaria de tratá-las como aliadas para que possamos nos aliar em pautas importantes.


Veja outras notícias

.