O caso Victor Chaves, violência contra a mulher e a manifestação do ‘gaslighting’
Via: The Huff post Brasil
A tática de fazer uma mulher parecer louca diante de uma denúncia de violência não é nova.
Na última sexta-feira (24), Poliana Bagatini registrou uma ocorrência contra o seu marido, Victor Chaves, integrante da dupla sertaneja Victor & Leo. Segundo a empresária, ela teria sido jogada no chão e chutada pelo marido. Além disso, Poliana teria tentado sair do local, mas foi impedida por um segurança e pela irmã do cantor. Poliana estaria sendo ameaçada pela família de Victor.
No sábado (25), Poliana fez o exame de corpo de delito. A mãe de Victor Chaves registrou um Boletim de Ocorrência contra a nora. Uma carta assinada por Poliana veio à tona no domingo (26). Nela, Poliana afirma que Victor não a machucou, mas que viu na polícia uma forma de se sentir segura diante da briga com a sogra em que Victor tentou contê-la. Após a divulgação da carta, Leo Chaves, irmão do Victor, se pronunciou no Instagram:
“Qualquer ser humano em situações emocionais adversas, está sujeito a atitudes precipitadas e inconsequentes. Ainda mais, estando grávida”.
Dessa forma, o irmão e parceiro do cantor defendeu o suposto agressor acusado de bater em sua mulher. Analisando toda a situação, temos a cena de uma mulher grávida, supostamente agredida pelo marido e ameaçada pela família do cantor, que foi à delegacia prestar queixa e, de uma hora para outra, aparece uma carta assinada por ela desmentindo a agressão.
O irmão, em seguida, trata de tornar público que essa mulher “encontra-se em uma situação emocional adversa”, que está sujeita a “atitudes precipitadas e inconsequentes” e retira dessa mulher sua credibilidade por estar grávida: “ainda mais, estando grávida”. Não há nenhuma prova contra o cantor, mas há uma tentativa de retratar mulheres como loucas e inconsequentes.
É uma forma de violência perigosa que faz a mulher sentir-se confusa e em dúvida sobre a própria estabilidade.
Não é de hoje que esta tática de fazer a mulher parecer louca e desestabilizada quando consegue livrar-se do papel de submissão e tomar as rédeas da própria vida funciona. Ao tomar o poder de si mesma falando sobre o próprio corpo, suas ânsias, suas vontades e sobre o respeito ao seu próprio ser, a mulher toma para si o poder sobre ela mesma, o que representa um perigo para uma sociedade machista que vê na mulher um ser estático, obediente, submisso e dócil. Ao jogar fora este papel de santa e desnudar-se de todas as características a ela impostas social e culturalmente, ela passa a ser vista como louca, desequilibrada, agressiva e inconsequente.
Desta forma, a mulher perde sua credibilidade, e seu poder é colocado em xeque. É importante que toda mulher conheça uma técnica comum e eficaz que a faz sentir-se louca diante de situações em que ela não é culpada, mas acaba por sentir-se assim: chama-se gaslighting.
A taxa de mulheres que retira a queixa das denúncias contra agressores chega a 70%.
Gaslighting é uma forma de abuso psicológico em que informações são deturpadas a fim de proteger e apoiar o abusador ou informações são criadas fantasiosamente com o objetivo de fazer a vítima duvidar do seu próprio pensamento, de sua consciência e, principalmente, da sua sanidade.
É uma forma de violência perigosa que faz a mulher sentir-se confusa e em dúvida sobre a própria estabilidade. Essa forma de violência naturaliza que mulheres acabem acreditando que determinadas características são próprias delas: exageradas, emocionais demais, sensíveis, loucas ou dramáticas.
Um exemplo clássico de ‘gaslighting’ é quando seu parceiro comete um erro. Você argumenta e discute. Naquela situação, você não sabe como, de repente, você está pedindo desculpa e se sentindo a causadora do problema.
É assim que funciona na maioria das vezes.
Mulheres, vocês não são loucas, sensíveis demais ou descontroladas. Vocês são seres humanos que não precisam colocar no bolso qualquer agressão contra vocês. Homens, quando contrariados, são considerados machões. Mulheres, ao contrário, são consideradas loucas. Libertem-se. Dane-se o que vão achar de vocês. Não reprimam sentimentos e dores. Você pode falar. Você pode gritar. Você pode denunciar. Não silenciem.
A taxa de mulheres que retira a queixa das denúncias contra agressores chega a 70%. Não porque sejam loucas, mas porque sentem medo, insegurança e desamparo. Estejamos juntas nos apoiando. Qualquer agressor deve ser denunciado. Qualquer mulher em situação de vulnerabilidade, agressão ou ameaça deve ser protegida. Em briga de marido e mulher, nós vamos meter a colher, sim.