Após 35 anos, CIDH notifica o Relatório Final de Mérito do Caso da Defensora de Direitos dos Trabalhadores Rurais, Margarida Maria Alves
Fonte: CEJIL (www.cejil.org)
Na última sexta-feira, dia 14 de dezembro de 2018 a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) notificou os peticionários da adoção do Relatório Final de Mérito relativo ao caso da defensora de direitos humanos Margarida Maria Alves, assassinada em 12 de agosto de 1983 na luta pelos direitos dos trabalhadores rurais de Alagoa Grande, na Paraíba. A decisão da Comissão vem 35 anos após a sua morte.
“Este caso se enquadra em um contexto generalizado de violação de direitos humanos, ataques e assassinatos que buscam silenciar defensores que ocorre até os dias de hoje no Brasil. A decisão da CIDH no caso de Margarida foi notificada no dia em que o assassinato de outra defensora, Marielle Franco, completa 9 meses de impunidade”, declarou Viviana Krsticevic, Diretora Executiva do CEJIL.
“A CIDH tem emitido diversos comunicados de imprensa condenando o assassinato de defensoras e defensores de direitos humanos, principalmente aqueles vinculados com a defesa dos trabalhadores rurais. Esta situação foi também observada pela CIDH em recente visita in loco e consta no relatório preliminar publicado após a visita”, mencionou Alexandra Montgomery, Diretora do escritório do CEJIL no Brasil.
Margarida Maria Alves foi uma proeminente líder sindical rural. Foi a primeira mulher a presidir o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande e o fez por 12 anos, em plena ditadura militar brasileira, movendo mais de 600 ações trabalhistas e realizando diversas denúncias; algo notório diante do contexto regional marcado pela subordinação dos camponeses aos grandes e influentes proprietários de terras da região. Durante sua gestão no Sindicato, Margarida fundou o Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural, para o desenvolvimento rural e urbano sustentável e para fortalecer a agricultura familiar.
Seu assassinato foi motivado pela sua atividade como defensora, o que contrariava os interesses da elite política e econômica local, conhecida como “Grupo da Várzea”. O grupo contava também com a participação de agentes do Estado. Os processos judiciais instaurados para investigar o assassinato de Margarida não foram capazes de responsabilizar os perpetradores: foram arquivados por prescrição, absolveram réu em tribunal do júri desprovido de imparcialidade e possíveis autores morreram no decorrer do processo.
O caso foi peticionado pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL), em conjunto com o Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (GAJOP), Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Fundação de Defesa dos Direitos Humanos Margarida Maria Alves (FDDH-MMA) em 17 de outubro de 2000. Passados trinta e cinco anos do assassinato da defensora o crime não ainda foi esclarecido, os responsáveis não foram identificados e nem sancionados pela sua morte. Esta decisão é uma oportunidade para que o Estado repare os familiares em razão da impunidade neste caso.
Como consequência da responsabilização do Estado brasileiro pela morte da defensora de direitos humanos Margarida Maria Alves a CIDH emitiu 4 recomendações para que o Estado brasileiro
1) repare os familiares da vítima com medidas de compensação pecuniária e de satisfação que incluam os danos materiais e imateriais;
2) realize uma investigação de maneira diligente, efetiva e dentro de um prazo razoável para esclarecer os fatos, identificar e sancionar os responsáveis materiais, intelectuais e estruturas de poder relacionadas a sua morte;
3) disponha de medidas de atenção à saúde física e mental para os familiares de Margarida Maria Alves;
4) disponha de medidas de não repetição, como o fortalecimento do Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, incluindo a prevenção de atos de violência contra defensores e defensoras de direitos dos trabalhadores no Brasil.
Especificamente com relação à terceira recomendação, manifestamos uma profunda preocupação com o estado de saúde do filho de Margarida Maria Alves, o Sr. José de Arimatéia Alves, uma vez que o mesmo vem padecendo e teve, na última semana um agravamento de seu quadro de saúde. Urgimos ao Estado brasileiro, especialmente o estado da Paraíba e o município de João Pessoa para que atuem de maneira diligente e com brevidade para garantir a plena recuperação do Sr, José de Arimateia, bem como a manutenção de sua saúde, mediante atendimento médico regular e acesso aos medicamentos e tratamentos que se fizerem necessários.
“Esperamos que o Estado, cumpra com essas recomendações e as veja como uma oportunidade de renovar e demonstrar o seu compromisso com os direitos humanos”, afirmou Montgomery. “Estas são medidas primordiais para fortalecer o importante trabalho das defensoras e defensores de direitos humanos e evitar que novos casos de violações relacionados aos defensores dos direitos dos trabalhadores rurais continuem acontecendo no Brasil”.