Há 25 anos na defesa e promoção dos direitos das mulheres

Themis entrevista: Soraia Mendes, jurista e pós-doutora em Terias Jurídicas Contemporâneas

A jurista, professora e pós-doutora em Teorias Jurídicas Contemporâneas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Soraia Mendes é a terceira entrevistada da série da Themis que aborda a participação das mulheres na política. 

Para a defensora dos direitos das mulheres, a lei que configura a violência política de gênero como um crime eleitoral é um avanço, contudo, “embora importantes, as leis nem sempre bastam ou dão conta da complexidade de muitos fenômenos sobre os quais versam”. 

Confira, a seguir, a entrevista completa:

1 – O que é violência política de gênero e como ela afeta as mulheres? (Quais as características, como reconhecer?) E, 2 – No âmbito jurídico, tens falado que há leis criadas para combater as diferentes formas de violência contra a mulher, mas questiona a quem essas políticas estão de fato atingindo. Nesse contexto, como enxergas a violência política de gênero?

Nos termos da lei, que recentemente completou um ano, a violência política de gênero configura um crime eleitoral (art. 326-B do Código Eleitoral) consistente em “assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, utilizando-se de menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia, com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo”. Essa lei foi um avanço para tornar visível o tema e, em certa medida, também para a necessária repressão das condutas que descreve. Contudo, embora importantes, as leis nem sempre bastam ou dão conta da complexidade de muitos fenômenos sobre os quais versam. E, por uma dessas macabras casualidades do destino, só me foi possível atender ao convite formulado para esta entrevista no dia seguinte ao atentado contra a vida da vice-presidenta da Argentina, Cristina Kirchner. Um ato gravíssimo praticado por um brasileiro, homem, branco e de extrema direita. Observe que, em certos momentos históricos de obscurantismo, como o que temos vivido especialmente no Brasil nos últimos anos, matar, depor de seus cargos ou tentar matar mulheres que desafiam barreiras e ingressam na política é a expressão maior da linguagem misógina da qual as condutas descritas na lei brasileira são somente uma parte da mensagem de que o lugar das mulheres não é no espaço público. Não se trata de reduzir a importância da lei que temos, mas de tratá-la em sua real amplitude. Ou seja, de pontuar sempre que a eliminação de toda e qualquer conduta que vise impedir, obstaculizar ou restringir a participação feminina no que se refere ao exercício de liberdades e direitos políticos depende do reconhecimento do caráter estrutural que os casos de Marielle, Dilma e, agora, Cristina simbolizam.

3 – Pode-se afirmar que a violência política de gênero é uma das causas da sub-representação das mulheres nos espaços de poder e decisão?

Com certeza. Não tenho dúvida alguma de que, considerado o caráter estrutural de classe e raça, responsável pelo alijamento de mulheres da periferia e negras da política, a violência é um elemento fundamental para a tomada de decisão de qualquer mulher em enfrentar o cenário político.

4 – O que uma maior participação feminina nos espaços de poder pode representar na promoção da igualdade de gênero e no ambiente político-eleitoral?

Essa já é uma questão que merece um aprofundamento maior do que é possível tratar aqui, pois tenho muito claro que igualdade, equidade, paridade e gênero não são expressões que nos permitam uma análise descolada dos compromissos de classe e raça no contexto de uma pauta feminista. Assunto para outra entrevista!


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